Arranque

Por você e por mim

Carla Santos
Revista Subjetiva
Published in
2 min readMay 26, 2020

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Arquivo pessoal

Estou há alguns meses olhando a tela do celular que eu uso para escrever. Queria saber por onde começar.

O começo de 2020 foi diferente para mim. Eu tinha expectativas objetivas, não eram acima, não eram abaixo, eram reais e consistentes. Eu saía de casa às 6:30h, retornava às 22:40h, de segunda a sexta por conta dos dois turnos de aula e meio turno de trabalho. Os meus finais de semana ficavam guardados para fazer algum bico de serviço, assistir videoaulas e namorar. Todas essas atividades construíam minha rotina que eu acomodei com muito respeito no meu coração.

Eu sei que a vida não é fácil para ninguém e meu dia a dia de estudos e trabalho é um privilégio ter. Mas isso tudo foi diferente pra mim porque eu sentia o arranque nos meus passos, na rua, sob o sol forte, indo na direção da minha obrigação, foi diferente porque eu queria ir. Eu sentia minhas vértebras na minha coluna torta e mal acomodada na cadeira serem anestesiadas pela minha vontade de estudar, foi diferente porque eu queria aprender. Eu sentia meus impulsos domados pelo meu próprio e recente auto cuidado, eu fui um corpo machucado, mas eu escolhi viver. Esse ano eu quis viver.

Hoje, a TV apavora a gente mostrando a realidade que engole tantas vidas, em tantos lugares. Todos os planos, avanços e metas são mesmo insignificantes enquanto os minutos de silêncio se acumulam por horas e horas. Essa dor não foi uma escolha de tantas famílias que hoje estão desfalcadas e o futuro, na melhor das hipóteses, parece incerto. Mas observando ao redor, dentro de cada hospital tem alguém com o arranque que o mantém firme pra curar outro corpo, dentro de cada laboratório tem alguém com as vértebras doloridas depois de horas e horas buscando uma luz pra essa neblina e, por fim, dentro de cada casa isolada tem alguém que escolhe viver.

Essas podem ser algumas das nossas lições. Eu estou torcendo por você e por mim, nós vamos sair dessa.

Fique vivo.

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